O prejuízo da seca calculado no Nordeste nesses três anos é equivalente
à soma do PIB (Produto Interno Bruto) de 2013 --dados mais recentes do IBGE--
dos Estados de Alagoas, Piauí e Sergipe. Somadas, as riquezas desses Estados naquele ano
chegaram a R$ 103 bilhões, sem correção da inflação. Na prática, é como se a
economia regional perdesse a riqueza de um desses Estados por ano.
"Esperávamos
um valor muito menor. Em um ano compilado, em 2013, por exemplo, o governo
federal falou que a seca deu prejuízo de R$ 18 bilhões aos cofres públicos.
Mas, quando você vai ver os municípios, que realmente estão conectados com essa
realidade, o número é bem maior", afirma um dos responsáveis pelo
levantamento, o técnico de Defesa Civil da CNM Johnny Amorim.
Segundo
ele, com o sistema criado pelo governo federal, foi possível chegar ao prejuízo
material dos eventos. "Antigamente, os governos federal e estaduais tinham
muita dificuldade em realizar esses levantamentos. Geralmente, as informações
ficavam espalhadas por toda administração pública, em diversos órgãos. Sem essa
avaliação, não há como fazer um plano de contingência. A seca, diferentemente
da chuva, exige o convívio, é algo permanente."
Quem mais perdeu dinheiro
O
estudo detalha os prejuízos da seca por área. O setor mais abalado foi a
agricultura, no qual a perda de safra causou um prejuízo no Nordeste de R$ 74,5
bilhões. Na pecuária, foram R$ 20,4 bilhões de prejuízo com a morte e perda de
valor dos animais. Já os demais prejuízos são da indústria e do poder
público.
"Houve
grande frustração de safra em todas as áreas do semiárido, perdeu-se grande
parte do rebanho, especialmente de bovinos, não só por morte como também
animais que foram vendidos por preços muito baixos para outras regiões. Houve
grande perda das pastagens, uso predatório de plantas da caatinga para
alimentação animal, morte inclusive de muitas espécies nativas (em determinadas
áreas, essas mortes chegaram a 30% a 40% das plantas)", diz o estudo.
Para
os técnicos, a seca desta década tem uma característica diferente de outras do
passado. "O que houve de diferente para as demais secas históricas de
proporções semelhantes é que nesta não se observou o êxodo em massa da
população de determinadas áreas ou mesmo os saques em feiras e mercados. Também
não houve morte de pessoas por fome e sede. Ainda que não seja uma solução definitiva
para o problema, isso se deve em grande parte às políticas de complementação de
renda ora em curso no país", destaca o documento, se referindo a programas
assistenciais como o Bolsa Família.
Entre
dezembro de 2012 e dezembro de 2015, por exemplo, foram 7.371 decretações de
emergência ou calamidade pública em decorrência da seca, sendo 6.295 no
Nordeste.
"É
importante salientar que tanto a União como Estados e municípios jamais
conseguiram suprir financeiramente tais prejuízos, uma vez que, de janeiro a
setembro de 2015, a seca causou um prejuízo aos cofres públicos municipais
nordestinos de R$ 16,4 bilhões."
Para
o técnico Johnny Amorim, o desafio das autoridades agora é tentar achar meios
de calcular o prejuízo social. "Você sabe que não se morre mais de fome e
de sede, mas os problemas de saúde gerados pela falta de água ou pela água de
qualidade são desconhecidos. Os governos não têm meios de fazer um levantamento
até que ponto vão os prejuízos à população, como um garoto desnutrido ou que
tem alguma falta de vitamina pelo consumo de água imprópria ou em
escassez", afirma o especialista da CNM.
Produtores sentem
No
Nordeste, não há produtor que não tenha sentido o impacto da seca. "São
cinco anos de muito pouca água. Tem gente fazendo poço, comprando carro-pipa;
tem gente que ainda tem uma palma ou um capim seco para dar ao gado, quem não
tem e não pode comprar vende para não ver o bicho morrer de fome", conta
Márcio Oliveira da Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alcantil, no sertão paraibano (a 197 km de João Pessoa).
Segundo
ele, o ano de 2016 não foi diferente e chegou a ser pior que em 2015. "A
chuva neste ano foi pouca demais. Tivemos quatro, cinco chuvadas só. Plantei
três vezes milho e feijão, mas foi perdido."
No
sertão de Alagoas, a situação não é diferente. "Há dois anos que não
consigo fazem silo para os animais. As barragens todas daqui secaram, e os
animais tomam água suja de poços que estão ficando podres", conta o
pequeno criador e produtor Isaac Pita.
Segundo
um relatório do Banco Mundial divulgado na semana passada,
os desastres naturais geram um prejuízo superior a US$ 300 bilhões no mundo e
colocam 26 milhões de pessoas na pobreza. O documento traça os impactos humanos
e econômicos dos fenômenos meteorológicos extremos sobre a pobreza. Assim como
a análise da CNM, o Banco Mundial afirmou que os prejuízos calculados são mais
devastadores do que se pensava. UOL // Carlos Madeiro