Se alguém te pedisse para imaginar o diabo, provavelmente
viria à mente um demônio com um tridente nas mãos. No entanto, por centenas de
anos, o diabo cristão não foi retratado pela arte religiosa e, quando
finalmente surgiu, era azul e não tinha chifres ou cascos.
A imagem mais familiar para nós surgiu pelas mãos de
gerações de artistas e escritores que pegaram o pouco que é dito pela Bíblia
sobre Satanás e o reinventaram ao longo do tempo.
A Bíblia diz que Satanás era o maior adversário de Deus.
Na Bíblia judaica, o diabo é apenas outro agente subordinado a Deus, um anjo do
mal, uma alegoria que simbolizava a inclinação maligna dos homens e mulheres.
Esse personagem foi desenvolvido pelos cristãos até transformá-lo em uma
representação da maldade suprema.
A doutrina cristã diz que Satanás assumiu a forma de uma
serpente e tentou Eva no Jardim do Éden, mas não há nenhuma menção ao diabo no
livro Genesis. Foi só mais tarde que os cristãos interpretaram a serpente como
uma encarnação de Satanás.
Também acredita-se que Satanás foi expulso do céu após
desafiar a autoridade de Deus. Porém, na Bíblia, um personagem misterioso é
expulso após rebelar-se contra Deus. A caracterização de Satanás como um anjo
caído deriva dessa tradição.
A imagem de um Satanás que governa o inferno e inflige
tortura e castigo aos pecadores também não encontra correspondência no texto
sagrado. O livro das Revelações profetiza que Satanás será enviado ao inferno,
mas sem qualquer status especial e sofrendo as mesmas torturas que os demais
pecadores.
As faces do diabo
Nos primeiros século
s do Cristianismo, não havia muita necessidade de
representar o mal na arte religiosa. Os cristãos acreditavam que os deuses
pagãos rivais, como o egípcio Bes e o grego Pan, eram demônios responsáveis por
guerras, doenças e desastres naturais.
Cem anos depois, quando o diabo apareceu na arte
ocidental, algumas representações incorporaram os atributos físicos destes
deuses, como o pêlo facial de Bes e as patas de cabra de Pan.
Anos 1260 ~ O diabo medieval
Na idade média, surgiu o retrato de Satanás mais
reconhecível. Foi uma época de muito sofrimento, que ficou ainda pior com o
surto de peste negra, a epidemia mais devastadora da história humana, com
milhões de mortos na Europa.
Como a Igreja não podia proteger os fiéis da doença, as
representações de Satanás centraram-se nos horrores do inferno, refletindo o
ânimo do momento e lembrando por que não se devia pecar.
Anos 1530 ~ Propaganda endiabrada
Há uma longa tradição de associar o diabo aos inimigos do
Cristianismo dentro e fora da Igreja.
Quando ela se dividiu durante a Reforma, católicos e
protestantes se acusaram mutuamente de estarem sob a influência do diabo com
propagandas jocosas e grotescas sobre esta corrupção.
Anos 1500-1600 ~ Feitiços e sedução
No início do período moderno, pessoas eram acusadas de
fazer pactos com o diabo e praticar bruxaria. Satanás era frequentemente
representado como um sedutor e se achava que as mulheres eram especialmente
vulneráveis a seus encantos.
Imagens mostravam mulheres em atos sexuais com o diabo,
por elas serem consideradas o sexo frágil e mais propensas a caírem em pecado
por serem incapazes de dominar seus desejos carnais.
Se Satanás conseguia corromper o corpo femino, era uma
ameaça à segurança familiar, à santidade e até mesmo à fertilidade da
comunidade.
Um diabo iluminado
Os escritores e pensadores iluministas reinterpretaram a
história do diabo para que se ajustasse às preocupações políticas da época.
John Milton descreveu um Lúcifer psicologicamente complexo no poema Paraíso Perdido, que conta a queda em
desgraça de Satanás.
Enquanto os textos religiosos anteriores haviam examinado
a motivação de Satanás para condená-lo, o Lúcifer de Milton é um personagem
atraente e solidário que encarna os sentimentos de rebeldia do republicanismo
do século 17.
Para alguns artistas românticos e iluministas, Satanás
era um nobre rebelde
Anos 1900-2000 ~ Animal político
Quando a ciência conseguiu explicar a morte, as doenças e
os desastres naturais, a figura do diabo ficou ameaçada. Havia lugar no mundo
laico para Satanás?
Foi quando um diabo urbano e sofisticado entrou em cena.
Seguindo uma tradição de identificá-lo com inimigos políticos e religiosos, o
diabo foi usado para ilustrar a oposição política por meio de caricaturas e
sátiras.
Além disso, Satanás encontrou seu lugar no mundo
comercial, tornando-se sinônimo de excessos pecaminosos, aparecendo em
propagandas para vender desde chocolate e champagne até carros de luxo. BBC
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