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27/09/2009 00:00:00

Especiais


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com marciolina.teixeira@dp.net.com

Um novo mapa do usuário de crack está desenhado. A droga, antes usada principalmente pelas classes C e D , entrou no mundo supostamente blindado dos adultos e da classe média e até na alta. O fenômeno, observado pelos especialistas ao longo dos últimos cinco anos, não estancou na idade e na classe social. O crack também está dominando os usuários de outros entorpecentes. Eles trocam cada vez mais o álcool, a maconha, a cola de sapateiro ou a cocaína pelas pedras. Considerada de efeito devastador, essa droga, por enquanto, vence a batalha. E acende o sinal de alerta: o ritmo frenético de crescimento no número de dependentes não foi acompanhado na mesma velocidade pela criação de unidades de tratamento e internamento. Se transformou em um problema de saúde pública. E de segurança.

O psiquiatra e diretor do Instituto Recife Atenção Integral aos Dependentes (Raid), Evaldo Melo, reconhece que não esperava esse perfil de migração no uso do crack. "Havia muito preconceito em relação à droga. Achava-se que era de pobre e de adolescente. Que não havia necessidade de internação. Hoje a população que precisa de tratamento está desassistida em todo o país. Isso é muito grave. O Ministério da Saúde tem que correr atrás de uma omissão que começou há cinco anos", alerta. Segundo Melo, atualmente 50% dos internos do Raid são dependentes desse entorpecente. Há cinco anos esse índice de ocupação era de apenas 10%. No instituto, o internamento pode durar até 60 dias e custa em média R$ 3 mil.

Para especialistas como Melo, o dependente do crack em estágio avançado (que rouba ou vende os próprios bens para sustentar o vício, se afasta do convívio social e familiar) somente tem boas chances de superar o problema através de internamento. Que precisa, na maior parte das vezes, ser voluntário. Ou seja, partir do interesse do usuário. Além das clínicas particulares, como o Raid, no estado há poucas opções de tratamento gratuitas. Um outro obstáculo é que nesses locais as equipes não são capacitadas para lidar com o usuário do crack, que ainda é muito estigmatizado.

Caminhos de apoio - Os Centros de Assistência Psicossocial Álcool e Drogas (Caps/AD), instalados em apenas cinco dos 185 municípios pernambucanos, são uma alternativa para aconselhamento às famílias e atendimentos rápidos. Os hospitais Otávio de Freitas e da Mirueira somente atendem emergências. As opções de internamento gratuito são as três Casas do Meio do Caminho, que seguem o modelo do Raid, e as comunidades terapêuticas, que pregam a abstinência e apostam na religião para afastar o vício. Essas últimas nem sempre bem vistas por médicos que dizem que ao final do tratamento o interno apenas troca a dependência das drogas pela religiosa. Outros falam que sem o suporte médico o índice de recaída chega a 80%.

"Aceitamos qualquer pessoa. Estudamos a Bíblia, somos cristãos, temos terapia ocupacional, espiritual, artesanato, reciclagem, criação de galinhas, dinâmica de grupo. Hoje não conseguimos atender a demanda. Temosmais de 30 na fila de espera", comentou Éverton Santos de Oliveira, da coordenação do Desafio Jovem, comunidade terapêutica de cunho evangélico. Oliveira registra, em média, 40% de recuperação após um internamento de sete meses, que, segundo ele, não inclui medicação.

Músico, 33 anos, usuário de álcool e maconha, Lucas (nome fictício) migrou para o crack no final do ano passado. Na terceira vez em que usou a droga, se viciou. As pedras chegaram a servir de consolo depois de uma separação conjugal. Há cerca de três meses, foi levado por um vizinho para uma igreja evangélica. Conta que rezou e teve força de vontade para sair do vício. Ainda resiste. "Usava para esquecer os problemas, mas tudo piorava. Vendi TV, fogão e até instrumento musical para comprar crack. Até hoje ainda sinto uma vontade enorme de fumar. Tive que me afastar de todos que usavam", desabafa. Por enquanto, o músico desafia as estatísticas de reincidência. Luta por um destino sem os efeitos da droga.




 

 


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