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Mundo
18/06/2020 20:00:00

vOs latinos que fizeram os EUA funcionarem durante a pandemia de coronavírus


vOs latinos que fizeram os EUA funcionarem durante a pandemia de coronavírus

O dia estava marcado fazia tempo no seu calendário. Em 22 de abril de 2020, ele completaria 62 anos. Não era um aniversário qualquer: terminava uma etapa da sua vida. “Ele tinha decidido que aquela seria sua última jornada de trabalho. Ia se aposentar para voltar para casa e cuidar da mãe dele, em Michoacán, no México. Passou anos sonhando com esse dia”, conta sua filha María, de 25 anos. Mas José Andrade não pôde cumprir seu sonho.

Passou mais de 20 anos empregado em uma unidade de processamento de carne do frigorífico JBS em Marshaltown, Iowa (Estados Unidos), ombro a ombro com outros trabalhadores, muitos latinos como ele, separando a carne das carcaças dos porcos para encher as gôndolas refrigeradas dos supermercados de todo o país. Oito ou nove horas por dia, 40 ou 50 horas por semana, dependendo de se trabalhava aos sábados ou não. “Era esse tipo de pessoa, como muitos pais imigrantes, que tinha valores sólidos e ia trabalhar todo dia, mesmo que estivesse resfriado, mesmo que nevasse, o que fosse”, recorda sua filha María. “Nunca ligava para a empresa desculpando-se por não ir, trabalhava inclusive nos seus aniversários”.

“Quando meu pai começou a apresentar sintomas, já tínhamos lido notícias sobre focos de covid em frigoríficos da mesma companhia em outros Estados. Teriam tempo de implementar mais medidas de segurança, mas não o fizeram”, denuncia María. Na noite de 17 de abril, quando sua filha ligou para ele ao chegar do trabalho, José Andrade respirava com dificuldade. Mal conseguia terminar as frases sem ficar ofegante. Sua filha chamou o serviço de emergências. Às três da manhã, a pressão arterial dele tinha caído drasticamente. Uma ambulância o levou para o hospital. Puseram-no em um respirador. Depois, diálise. Sedaram-no. Em quatro semanas, o coronavírus tinha terminado com sua vida.

Mais de 10.000 funcionários de frigoríficos nos EUA contraíram a covid-19 em seus postos de trabalho. Dezenas, como José Andrade, morreram. Durante mais de dois meses de confinamento, mais ou menos rigoroso em função da incidência da pandemia e do critério dos governadores de cada Estado, os norte-americanos continuaram comendo carne. Tiveram frutas e hortaliças em suas mesas. Suas ruas limpas, seu lixo recolhido, seus idosos cuidados. Tudo isso graças a uma legião de trabalhadores essenciais que não puderam se confinar em casa. E os latinos, estigmatizados durante três anos do Governo de Donald Trump, são uma parte fundamental desse coletivo.

O coronavírus golpeou com especial dureza a comunidade latina nos Estados Unidos. Ela constitui, por exemplo, apenas 10% da população de Washington e dos vizinhos Estados de Maryland e Virgínia, mas sofreram um em cada três casos de covid-19 na região. As mesmas taxas alarmantes de infecções foram vistas em Nova York, Chicago e Los Angeles. Segundo uma pesquisa do instituto Ipsos e da rede ABC, 26% dos latinos adultos nos EUA disseram conhecer alguém que havia morrido por causa do vírus ou de complicações relacionadas a ele. Com participação desproporcionalmente elevada na força de trabalho do varejo e dos serviços, apenas 16% dos 60 milhões de latinos do país, segundo um estudo, puderam trabalhar de suas casas.

10.000 empregados de frigoríficos nos EUA contraíram a Covid no trabalho

Jonathan Magdaleno, mexicano de 29 anos, sabia desde o começo que a covid-19 era algo sério. Ele é enfermeiro e trabalha em uma UTI especializada em doenças respiratórias. “Vimos desde o começo que os sintomas e o desenvolvimento da doença eram totalmente diferentes de tudo o que já tínhamos visto”, conta. Magdaleno está vivendo a pandemia como trabalhador, vendo o sofrimento na linha de frente, em jornadas das 19h às 7h

Chegou aos EUA sem documentos quando tinha 12 anos. Conseguiu estudar enfermagem graças ao programa DACA, aprovado pelo presidente Barack Obama para evitar a deportação de imigrantes irregulares que chegaram quando eram menores de idade. Trump está tentando eliminar esse programa, que tiraria a proteção de centenas de milhares de jovens como Magdaleno, que está agora nas trincheiras do coronavírus salvando vidas. “Eu me meti nisto para fazer a diferença na minha vida, e esta é a minha chance”, diz. “Espero que o Governo perceba que [os imigrantes] estamos fazendo algo pelo país.”

Cidadão, imigrante regular ou indocumentado, o trabalhador que está arriscando a pele na linha de frente da pandemia nos Estados Unidos é latino. “Isso é especialmente verdade na cadeia de alimentos, da colheita ao empacotamento e processamento até a loja”, diz Kathy Finn, secretária e tesoureira do sindicato UFCW770, de Los Angeles, que representa trabalhadores de supermercados. “São pessoas pobres, mal pagas, sobretudo não brancas e imigrantes. Enquanto muitos podem trabalhar de casa, estas pessoas vão trabalhar diariamente para que todos possamos ter comida na mesa, ao mesmo tempo em que estão arriscando sua vida e a de suas famílias.”

April Knauel-Ramírez, de 43 anos, trabalha em um supermercado, mas hoje em dia parece que é numa usina nuclear. Diariamente às 5h toma um banho de desinfetante Lysol para ir para o trabalho. Idem na volta, quando tira toda a roupa antes de entrar em casa. A roupa do trabalho não entra na casa, que ela divide com a esposa. Seu filho de dois anos ficou com os pais dela. “Estou preocupada com eles. São sobreviventes de câncer”, diz por telefone de Grover Beach, na Califórnia. Ganha 17,47 dólares (88,82 reais) por hora, e sua jornada aumentou em duas horas durante a pandemia. “Certamente é uma ironia. Tantos ataques aos latinos e aos imigrantes antes disto, e agora ocorre que somos indispensáveis. Esta situação deveria dizer algo a muita gente.”

Chegou aos EUA sem documentos quando tinha 12 anos. Conseguiu estudar enfermagem graças ao programa DACA, aprovado pelo presidente Barack Obama para evitar a deportação de imigrantes irregulares que chegaram quando eram menores de idade. Trump está tentando eliminar esse programa, que tiraria a proteção de centenas de milhares de jovens como Magdaleno, que está agora nas trincheiras do coronavírus salvando vidas. “Eu me meti nisto para fazer a diferença na minha vida, e esta é a minha chance”, diz. “Espero que o Governo perceba que [os imigrantes] estamos fazendo algo pelo país.”

Cidadão, imigrante regular ou indocumentado, o trabalhador que está arriscando a pele na linha de frente da pandemia nos Estados Unidos é latino. “Isso é especialmente verdade na cadeia de alimentos, da colheita ao empacotamento e processamento até a loja”, diz Kathy Finn, secretária e tesoureira do sindicato UFCW770, de Los Angeles, que representa trabalhadores de supermercados. “São pessoas pobres, mal pagas, sobretudo não brancas e imigrantes. Enquanto muitos podem trabalhar de casa, estas pessoas vão trabalhar diariamente para que todos possamos ter comida na mesa, ao mesmo tempo em que estão arriscando sua vida e a de suas famílias.”

April Knauel-Ramírez, de 43 anos, trabalha em um supermercado, mas hoje em dia parece que é numa usina nuclear. Diariamente às 5h toma um banho de desinfetante Lysol para ir para o trabalho. Idem na volta, quando tira toda a roupa antes de entrar em casa. A roupa do trabalho não entra na casa, que ela divide com a esposa. Seu filho de dois anos ficou com os pais dela. “Estou preocupada com eles. São sobreviventes de câncer”, diz por telefone de Grover Beach, na Califórnia. Ganha 17,47 dólares (88,82 reais) por hora, e sua jornada aumentou em duas horas durante a pandemia. “Certamente é uma ironia. Tantos ataques aos latinos e aos imigrantes antes disto, e agora ocorre que somos indispensáveis. Esta situação deveria dizer algo a muita gente.”

El País



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