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22/05/2020 16:00:00

Como a pandemia fez alemães finalmente trocarem dinheiro por cartões


Como a pandemia fez alemães finalmente trocarem dinheiro por cartões

Há muito tempo, os habitantes da maior economia da Europa preferem usar dinheiro vivo para fazer compras, exceto as de maior valor. A aversão da Alemanha a pagamentos com cartão muitas vezes frustra os turistas, que podem ficar em uma situação difícil quando um restaurante não aceita cartões ou passar sede porque não têm dinheiro vivo para tomar uma bebida em uma loja de esquina. 

Boa parte da preferência da Alemanha por dinheiro vivo está enraizada no passado traumático e no colapso de várias moedas. Para quem morou na Alemanha Oriental (República Democrática Alemã) de 1949 a 1990, o estado de vigilância gerou desconfiança e criou um apego profundo ao anonimato que o dinheiro proporciona.

O país vinha lentamente alcançando seus vizinhos em relação ao uso de cartões para fazer compras em supermercados e outras lojas, e agora, com a propagação do coronavírus, avançou rapidamente para uma possível troca permanente do dinheiro vivo por cartões.

Conforme a pandemia se espalhava, o manuseio de euros de repente começou a parecer sujo e possivelmente mortal e, pela primeira vez, muitas empresas pequenas colocaram cartazes pedindo o pagamento com cartão.

A empresa do setor de pagamentos Initiative Deutsche Zahlungssysteme fez uma pesquisa com 1.475 pessoas, com idades entre 16 e 69 anos, e descobriu que 41% delas usaram cartões de débito com mais frequência entre o final de março e meados de abril do que antes da crise. Esse número sobe para cerca de 57% se contarmos os pagamentos com cartão de crédito.

A maioria das pessoas disse que pagou com cartão por razões de higiene e para respeitar a segurança dos lojistas. 

De acordo com o Comitê do Setor Bancário da Alemanha, mais da metade dos pagamentos com cartão no final de março foram feitos por aproximação, em relação a apenas 35% em dezembro.

Um sinal de alerta

Alexander von Schirmeister, vice-presidente executivo da empresa de pagamentos eletrônicos SumUp na Europa, disse ao Yahoo Finanças do Reino Unido que acredita que a recomendação da OMS de fazer transações com cartões em vez de dinheiro "é um alerta repentino para consumidores e comerciantes em um mercado como a Alemanha".

A SumUp, com sede em Londres, vende leitores de cartões e serviços conectados, principalmente para empresas pequenas, e cobra taxas pelas transações feitas com esses leitores. Alexander conta que as empresas que se adaptaram rapidamente aos pagamentos sem dinheiro, oferecendo, por exemplo, pagamentos com cartão on-line ou leitores em pontos de entrega, mostraram mais resiliência. 

A SumUp observou que as pessoas se adaptaram rapidamente a esse modo de comprar alimentos assim que começou o isolamento obrigatório.

"Na Alemanha, houve um aumento de até 20% nas compras com cartões [em uma semana] e não foi porque as pessoas passaram a comprar mais alimentos nesse período. Isso aconteceu porque elas estão substituindo as compras em dinheiro pelo cartão".

A SumUp também observou um aumento total de 40% nas transações com cartões nas bancas de jornal durante o período de isolamento obrigatório de quatro semanas, além de um aumento de 17% nos mercados de rua.

"É o típico caso do ovo ou a galinha: talvez os clientes tenham começado a não andar mais com dinheiro ou talvez os comerciantes tenham começado a aceitar pagamentos com cartão para respeitar as regras de distanciamento social", diz Alexander.

Os pagamentos com cartão superaram as compras em dinheiro na Alemanha pela primeira vez em 2018, de acordo com um relatório do EHI Retail Institute em Colônia, com € 209 bilhões (£ 182 bilhões, US$ 226 bilhões) gastos com cartão, e € 208 bilhões em dinheiro. No entanto, mais de três quartos das 20 bilhões de transações reais feitas naquele ano em lojas foram com dinheiro vivo.

A pandemia provoca mudanças

Gisela Bock, professora aposentada de História Moderna da Universidade Livre de Berlim e moradora de longa data da cidade, comenta que usa o cartão com muito mais frequência desde o surto de Covid-19.

"Na minha opinião, a crise está desempenhando um papel muito relevante na mudança. Pelo menos para mim, a questão da higiene é muito importante, embora eu não saiba exatamente até que ponto os pagamentos com cartão podem melhorar as condições de higiene", diz Gisela ao Yahoo Finanças do Reino Unido. "Também gosto de pagar quantias menores com cartão, e notei que as lojas estão aceitando cada vez mais esse tipo de pagamento para pequenas compras".

Gisela morou muitos anos no exterior e criou o hábito de fazer compras com cartão em vez de dinheiro. Ela diz que o marido, também professor universitário aposentado, é o exemplo oposto. Ele prefere pagar as compras com dinheiro, pois acha que assim controla melhor os gastos.

"Para mim, a 'visão geral' não é tão importante quanto a praticidade da forma de pagamento, mas tenho que admitir que realmente gasto mais dinheiro do que ele e nem sempre sei em que gastei", diz Gisela.

Uma pesquisa do Banco Central Europeu (ECB) de 2016 constatou que os alemães carregavam em média € 103 em suas carteiras, mais que qualquer um dos outros 19 países da zona do euro. No outro extremo da escala, os franceses tinham em média € 32 no bolso, e os portugueses apenas € 29.

Gisela, por exemplo, continuará pagando com cartão quando a pandemia de coronavírus terminar e, como historiadora, ela sabe que os hábitos sempre podem mudar. No entanto, para que essa mudança ocorra na Alemanha, ela considera "fundamental que a opção de pagamento com cartão seja oferecida" ou que a capacidade de escolher entre pagamento em dinheiro ou cartão seja igual.

O dinheiro ainda é essencial

"Quando começamos a incorporar uma certa mudança de comportamento, a menos que essa mudança tenha sido dolorosa ou catastrófica, não há razão para voltar atrás. Sim, as questões de saúde podem ter sido o gatilho, mas espero que possamos considerar o simples fato de que é uma maneira melhor e mais prática de fazer pagamentos", diz Alexander.

O medo do contágio forçou os alemães a usar seus cartões de débito, mas a mudança não acontecerá da noite para o dia. Uma pesquisa feita pelo banco central do país apontou que apenas 25% dos cerca de 1.000 entrevistados mudaram o comportamento de pagamento durante a pandemia.

"Diante do cenário atual, vemos que, mesmo em situações de crise, o dinheiro ainda é uma forma de pagamento muito usada no dia a dia", disse Johannes Beermann, membro do conselho do Bundesbank ao Deutsche Presse Agentur. "Não veremos nenhum efeito direto decorrente da situação atual no comportamento dos pagamentos em médio prazo".

Johannes acrescentou que a demanda por notas e moedas aumentou no início da pandemia e depois acabou voltando aos mesmos níveis do ano passado. 

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