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22/06/2019 09:00:00

'Revogar decisões de Moro na Lava Jato seria um erro muito sério', diz juiz federal dos EUA


'Revogar decisões de Moro na Lava Jato seria um erro muito sério', diz juiz federal dos EUA
Ilustração

Para o juiz federal norte-americano Peter Messitte, nome frequente em mesas redondas e debates organizados em Washington quando o assunto é o Brasil, os "diálogos (expostos pelo site jornalístico The Intercept Brasil) expõem principalmente um problema de privacidade, e não de promiscuidade".

Messitte viveu no Brasil nos anos 1960, teve um filho na capital paulista, lecionou na Universidade de São Paulo (USP), especializou-se na legislação brasileira e conviveu com ex-presidentes e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Conheceu o então colega de toga Sergio Moro em 2016, durante um seminário, e mantém contato com o atual ministro da Justiça e Segurança Pública desde então.

Para Messitte, habitual defensor da operação Lava Jato nos Estados Unidos, a interceptação de mensagens privadas trocadas por autoridades chama mais atenção do que o próprio conteúdo no caso dos supostos diálogos entre Moro, o procurador-chefe da força-tarefa, Deltan Dallagnol, e outros membros do Ministério Público Federal.

"Já tive conversas muito parecidas e isso nunca comprometeu meus casos", afirma o magistrado, que foi nomeado juiz pelo distrito de Maryland pelo então presidente Bill Clinton, nos anos 1990. "Revogar decisões de Moro na Lava Jato (com base nos vazamentos) seria um erro muito sério."

"Procuradores conversam com juízes. Existe uma interação frequente que, fora de contexto, pode ser vista como inapropriada, mas que em geral não afeta a essência das matérias (jurídicas)."

Na opinião do juiz, "funcionários do governo precisam de uma zona de privacidade para trabalhar de modo a não congelar suas operações".

Desde a divulgação das primeiras reportagens do Intercept, no domingo (9), Sergio Moro tem dito que não reconhece a autenticidade das mensagens. Moro também tem repetido que os supostos diálogos foram "colhidos por meio de invasão criminosa de hackers", e que as mensagens "podem ter sido adulteradas e editadas". 

"Reitera-se a necessidade de que o suposto material, obtido de forma criminosa, seja apresentado a autoridade independente para que sua integridade seja certificada", disse Moro através de uma nota do Ministério da Justiça, no dia 15 de junho. 

'Zona de privacidade'

O Código de Processo Penal brasileiro, em seu Artigo 254, estabelece que o juiz seja considerado suspeito "se tiver aconselhado qualquer das partes".

Nos diálogos divulgados, Moro teria, por exemplo, sugerido a Dallagnol inverter a ordem de fases da Lava Jato, bem como reclamado da frequência das operações.

Também teria criticado a atuação de uma das procuradoras - que mais tarde deixou de participar do primeiro depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Curitiba, em maio de 2017.

As conversas vazadas mostram também que o ex-juiz teria recomendado ao procurador, em dezembro de 2015, uma possível testemunha a ser ouvida em processo contra Lula.

A reportagem lembra ao magistrado americano que a legislação brasileira proíbe que juízes passem orientações a procuradores sobre como o Ministério Público deveria atuar em processos - um dos argumentos levantados pelo Intercept para apontar suposta suspeição de Moro e Dallagnol.

"Existem situações específicas e nem tudo está escrito na Constituição ou nas leis. Eu tenho total tranquilidade sobre minhas decisões e ficaria horrorizado em pensar que alguém pudesse ter acesso a todas as minhas conversas - assim como você e qualquer um ficaria", diz.

A maioria das conversas vazadas envolve o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol© Felipe Frazao / Agbr A maioria das conversas vazadas envolve o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol

"Sobre o argumento de suspeição, é preciso lembrar que muitos dos condenados confessaram seus crimes.", diz Messitte.

Ele ressalta que não considera tudo o que apareceu nos supostos diálogos "natural".

"É justo que haja uma discussão sobre o suposto conteúdo. Há trechos que, dependendo do contexto, podem ser, sim, problemáticos. Mas o hackeamento de autoridades é algo muito sério. Veja o que aconteceu com (a ex-presidente) Dilma Rousseff. Não seria coerente que a preocupação com o acesso ilegal a dados privados fosse a mesma agora?"

O grampo de Dilma

O juiz se refere a um escândalo global de 2013, quando o jornalista Glenn Greenwald, fundador do Intercept, revelou como o governo de Barack Obama espionou comunicações de cidadãos americanos e estrangeiros, a exemplo da então presidente Dilma Rousseff (PT), ministros, diplomatas e membros do gabinete da petista.

O episódio gerou uma crise diplomática entre os dois governos. À época, Dilma chegou a cancelar uma viagem oficial aos Estados Unidos após a resistência da Casa Branca em pedir desculpas oficiais pelo episódio de espionagem.

Dilma teve comunicações suas e de ministros grampeadas pelo governo americano© Roberto Stuckert Filho / PR Dilma teve comunicações suas e de ministros grampeadas pelo governo americano

Os documentos sobre a espionagem americana haviam sido obtidos pelo analista de segurança Edward Snowden e divulgados por Greenwald no jornal britânico The Guardian, que ganharia no ano seguinte com essas reportagens o principal prêmio jornalístico dos EUA, o Pulitzer - reconhecimento dividido com o jornal americano Washington Post.

"Hackeamento é crime e deve ser punido", repete o juiz americano. "Eu não ficaria surpreso se houvesse interferência estrangeira. É absolutamente possível que tenha vindo de outro país."

"É assustador", ele continua. "Isso está acontecendo por toda parte, não só no Brasil. Mas não estou aqui para tomar posição e apontar culpados ou suspeitos."

MSN



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