Os secretários de Educação dos estados brasileiros e do Distrito Federal divulgaram, nesta semana, uma nota pública com "as pautas e demandas consideradas como de máxima relevância e urgência" para a área de educação (veja lista abaixo). Segundo os secretários, a divulgação pública foi uma consequência do que eles consideram falta de articulação e comunicação dentro do Ministério da Educação.
Em entrevista ao G1, Fred Amâncio, secretário de Educação de Pernambuco e vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), explicou que a medida foi tomada após a entidade viu crescer sua preocupação quanto as rumos do MEC sob a nova gestão.
O Consed é a entidade que reúne e representa a posição de todos os secretários estaduais e distrital de Educação. Já os secretários municipais se unem em torno da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). As duas entidades atuam há anos junto ao ministério na elaboração e execução de programas nas escolas públicas brasileiras
Amâncio afirma que o maior problema, atualmente, é o fato de que estão vagos os dois cargos do MEC mais importantes para a articulação do governo federal com as redes estaduais e municipais: o de secretário-executivo e o de secretário de Educação Básica.
"Todos os interlocutores mais próximos saíram do MEC", explicou Fred Amâncio ao G1. "Os interlocutores mais diretos, no dia-a-dia, são a secretária de Educação Básica e o secretário-executivo, além do próprio ministro, mas ele tem outras atribuições."
Até a última segunda-feira (25), a pessoa à frente da Secretaria de Educação Básica (SEB) era Tania Leme de Almeida, que era secretária desde janeiro. Ela pediu demissão depois que uma portaria do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mudou as regras da avaliação de alfabetização, a pedido do secretário de Alfabetização, Carlos Nadalim, mas sem o conhecimento da SEB.
Já o cargo de secretário-executivo está vago desde 12 de março, quando Luiz Antônio Tozi foi demitido pelo ministro Ricardo Vélez Rodríguez. Desde então, duas pessoas foram indicadas publicamente para o cargo, mas nenhuma foi de fato nomeada. Atualmente, quem assina os despachos da Secretaria-Executiva é a antiga chefe de gabinete de Tozi, que aparece no "Diário Oficial da União" como "secretária-executiva substituta".
"Tanto ele [Tozi] quanto a Tania estavam com toda a boa vontade, o que já era uma coisa muito boa", diz Amâncio.
Segundo Amâncio, uma reunião do Consed com a então secretária Tania, que já estava programada, teve que ser cancelada e está sem data para acontecer.
Já a demissão de Tozi aconteceu no dia 12, mesmo dia em que ele se reuniu com representantes do Consed, mas os secretários, segundo Amâncio, não sabiam dessa movimentação. Durante a reunião, Tozi recebeu dos secretários a lista de demandas urgentes que foi divulgada publicamente nesta semana.
Mas, por outro lado, os secretários deixaram o MEC sem saber que, a poucos quilômetros dali, no Inep, uma portaria estava sendo pensada para alterar as regras do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) para adiar mais uma vez a avaliação da alfabetização no Brasil.
Pegos de surpresa, os gestores estaduais criticaram a medida, que foi assinada pelo presidente do Inep, Marcus Vinicius Rodrigues, e publicada no dia 25. Amâncio explica que a última avaliação de alfabetização aconteceu em 2017, e, se ela não for realizada em 2019, o Brasil corre o risco de ficar com um "buraco" na série histórica.
A decisão também sofreu críticas das redes municipais e de especialistas na área, e a secretária Tania pediu demissão do cargo no fim da tarde. No dia seguinte, o ministro revogou a medida e demitiu Rodrigues.
A falta de comunicação foi criticada pelo agora ex-presidente do Inep em entrevista ao "Bom Dia Brasil" na quarta-feira (27). No mesmo dia, Vélez, em audiência na Câmara dos Deputados, acusou Rodrigues de "puxar o tapete", afirmando que ele tomou sozinho a decisão de alterar o cronograma da avaliação de alfabetização. Rodrigues, por sua vez, diz que fez isso após um pedido feito por Carlos Nadalim, secretário de Alfabetização do MEC, conforme mostra esse documento:
Trecho do documento assinado por Carlos Nadalim — Foto: Reprodução
Segundo o secretário de Educação de Pernambuco, a falta de comunicação entre as secretarias do MEC, a Secretaria-Executiva e o Inep também se traduz em um distanciamento das entidades como Consed e Undime, que são, na prática, a articulações que garantem que as políticas públicas de educação vão sair de fato do papel.
Amâncio lembra que essa articulação tem sido construída ao longo dos últimos anos, e vinha se fortalecendo recentemente, inclusive após a mudança de gestão, com o impeachment de Dilma Rousseff e a posse de Michel Temer. Entre os exemplos principais dessa articulação estão a elaboração dos planos estaduais e municipais de Educação, após o Congresso aprovar por unanimidade o Plano Nacional de Educação (PNE), e a elaboração das diversas versões da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
A última etapa da Base, a aprovação da versão para o ensino médio, foi finalizada no fim de 2018, e agora o foco está na implementação do documento nos currículos e projetos pedagógicos de cada escola.
O secretário aponta, porém, que esse é um exemplo concreto de como o MEC não tem sido eficaz em de fato dar andamento às atividades.
No ano passado, a gestão Temer, sob o comando do ex-ministro Rossieli Soares, anunciou a criação do programa de apoio à implementação da BNCC, aos moldes do que já foi implementado para a BNCC do ensino infantil e do fundamental.
Antes de entregar o cargo, Rossieli chegou a dizer que o MEC já havia empenhado os recursos para o programa, o que quer dizer que o dinheiro faz parte do orçamento do ano passado e já está garantido para esse uso. Mas, de acordo com gestores, eles ainda aguardam a execução por parte da gestão Vélez. Até agora, o ministro apenas afirmou ter incluído a implementação da BNCC na lista de sete prioridades do MEC, mas nenhuma medida foi tomada de fato.
Amâncio explica que, quando uma nova gestão assume o governo federal, é comum que o novo grupo leve um tempo para se adaptar às novas funções, mas dizem que, no caso atual, a situação tem se mostrado pior.
Ele também ressalta que o trabalho cada vez mais articulado entre governo federal, estaduais e municipais na área de educação, que começou na gestão de Dilma e se fortaleceu na de Temer, agora parece sofrer um retrocesso na gestão de Jair Bolsonaro.
"Não é uma construção de uma pessoa ou de um governo. É uma construção de vários governos e várias pessoas. Não era necessário criar um outro caminho", afirmou o secretário.
Amâncio lembra que, nas décadas anteriores, a falta de articulação entre o MEC, que formula as políticas, e as redes, que executam as políticas, foi responsável pelo fracasso de diversos programas federais.
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