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Maceió
15/10/2018 19:06:00

Pescadores e marisqueiros lutam pela sobrevivência e contra futuro incerto


Pescadores e marisqueiros lutam pela sobrevivência e contra futuro incerto
Ilustração

Gazetaweb

O sol ainda nem pensou em nascer, sequer chegou perto disso, e já é hora de sair para mais uma madrugada exaustiva de trabalho para o pescador Sebastião Maximino, de 28 anos. É da comunidade Sururu de Capote, no bairro do Vergel do Lago, em Maceió, que o pescador sai de casa todos os dias, por volta de 1h da madrugada, e segue na difícil rotina até as 6h para conseguir o sustento da família na Lagoa Mundaú. O árduo trabalho continua até o fim do dia.

Apesar da pouca idade, Sebastião já exerce o ofício há 15 anos, ou seja, iniciou na atividade com apenas treze anos, ainda bem adolescente, quando, na verdade, esse seria o momento de estudar, brincar e não ter obrigações. Mas, a realidade de quem vive e depende da pesca na comunidade Sururu de Capote é bem diferente.

Sem garantias e nem qualidade de vida, os pescadores ainda vivem com a atual ameaça da extinção dos pescados. Há tempos o peixe deixou de ganhar vida em abundância na lagoa. Agora, quem vive da pesca, precisa migrar para outras regiões em busca do sustento da família. 

Outra alternativa encontrada para garantir a renda dos pescadores vem da extração do sururu, que Sebastião diz que já não rende mais como antigamente. Ele tira de R$ 200 a R$ 300 por mês. "Isso quando está bom. Quando está ruim, que o sururu não está rendendo e não tem peixe, é menor do que isso", pontua o pescador. 

Sebastião é casado e tem três filhos. Todos vivem do que ele consegue com a venda dos pescados. "É uma média de 15 a 20 quilos por dia, mas nem sempre é assim. O sururu, com certeza, está diminuindo, porque antigamente, em todo canto que a gente chegava, tinha e agora são poucos lugares que encontramos o sururu".

A vida não é fácil. Muitas pessoas que vivem à margem da Lagoa Mundaú não tem outra fonte de renda. Eles vivem na linha da miséria, sem estudo, muitas vezes sem nem mesmo o que comer. Apesar de todas as dificuldades, eles seguem seu caminho sem reclamar dos muitos problemas que passam.

A casa é simples, feita de madeira. Um pequeno cômodo, onde os móveis fazem a divisão dos cômodos. No local, vivem Sebastião e sua família.

Mas, ali, garante Sebastião, nunca passaram fome. A simplicidade expressada pelo marisqueiro é tal qual a da sua modesta residência. Mesmo com todas as dificuldades enfrentadas no dia a dia e a incerteza de um futuro promissor, Sebastião não tem o que lamentar. Mas deveria."Passar fome nós não passamos. Não tenho do que reclamar, tem gente em situação muito pior. A gente não passa necessidade, mas sufoco a gente passa todo dia". 

 

O mesmo é relatado pela esposa do marisqueiro. Ela lembra que, no período em que o sururu sumiu da lagoa, o marido teve que ir a outro município pescar e, dessa forma, garantir o sustento da família. 

"Ele passou duas semanas em Marechal Deodoro para trazer alguma renda para dentro de casa. Às vezes, ele pescava, às vezes não. E eu, com três crianças pequenas em casa, passando por dificuldade, e aqui na lagoa sem ter peixe, sururu, nem nada, a única opção que ele teve foi deixar a gente aqui e ir pra Marechal. O pouco que ele pegava lá mandava, mas fome a gente nunca passou", garante Maria da Silva.

SEGURO-DEFESO

 

Manoel, presidente da Colônia dos Pescadores, ao lado de pescadores na Sururu de Capote

FOTO: STELLA SANTANA

Assim como o Sebastião, outros 11 mil trabalhadores da Lagoa Mundaú, entre pescadores e marisqueiros, vivem a agonia de não ter a garantia de que conseguirão ter renda para manter a família durante todos os meses do ano. 

"A Lagoa Mundaú é uma mãe, quando acaba algumas espécies de peixe e, principalmente, o sururu, pode ter certeza que é época de fome no Vergel. Quando não tem o pescado ou não se pode pescar eles migram para outro tipo de serviço como pedreiro, servente de pedreiro, pintor, sem nenhuma garantia de que irão conseguir trabalho. É um absurdo, nenhum governo olha para essa lagoa. Qual é a indústria, em Alagoas, que tem 11 mil trabalhadores?", questiona a situação emergente da Mundaú Manoel Messias, presidente da Colônia dos Pescadores Z5, do Vergel do Lago.

Alguns períodos do ano, onde os pescadores ficam proibidos de pescar algumas espécies para fins comerciais, o governo federal, por meio do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), concede o benefício chamado seguro-defeso. Este garante um salário mínimo, como forma de assegurar renda desses pescadores em todo o país. 

No entanto, apenas uma parcela dessa população é beneficiada. Aqui em Alagoas, as espécies definidas pela Instrução Normativa do Ibama, que regula nos itens 14; 48; e 206, são camarão branco, rosa e sete barbas, além da lagosta verde e vermelha. O sururu não se encontra em extinção, mas apresenta, em certos períodos, uma escassez que prejudica diretamente a renda dos marisqueiros e marisqueiras.

 

Lixo e esgoto são apontados como a causa do sumiço dos frutos da lagoa

FOTO: PATRÍCIA MENDONÇA

Porém, de acordo com o presidente da Colônia dos Pescadores do Vergel do Lago, o pescado que está sumindo está além dos que foram definidos pelo Ibama para que sejam cobertos pelo seguro-defeso. "Tem períodos que somem daqui da lagoa o mororó, a tainha, o bagre, o turiman, o camurim e o camarão", alerta Manoel. 


Sebastião, o pescador do início desta matéria, disse que nunca recebeu o seguro-defeso, mas afirma que outras pessoas da região chegaram a receber por um período. Agora, o benefício não alcança pescadores e marisqueiros da região. No entanto, ele garante que seria uma alternativa, já que nem o pescado e nem o sururu rendem mais como antes. "Ia ajudar bastante, com certeza".

 

Para a vice-presidente da Federação dos Pescadores do Estado de Alagoas (Fepe-AL), Maria Aparecida, a lei que garante o benefício ao pescador deve ser revista para que o direito chegue, também, aos marisqueiros que trabalham, principalmente, com a extração do sururu, marisco mais ameaçado de extinção nas lagoas de Alagoas.

 

Peneirar o sururu é um dos processos para a limpeza da iguaria

FOTO: PATRÍCIA MENDONÇA
"Para quem trabalha na cadeia produtiva do sururu, quando há escassez, a gente precisa dar assistência a esse povo. Mas, antes disso, tem que haver um estudo por parte do Ibama para saber o que aconteceu, para eles terem o direito deles. No ano passado, foram quatro meses com a quantidade de água doce maior do que a salgada, o que fez o sururu sumir, e esse período deveria ter sido pago de algum fundo durante esse tempo sem sururu", avaliou Maria Aparecida.

 

Segundo ela, é preciso fazer um estudo em Alagoas para que o governo federal possa garantir o seguro-defeso também aos marisqueiros. 

"Quando se trata da lagoa e do molusco, concordo que se haja proteção para o pescador, que veja a fase, que haja um estudo, uma pesquisa como foi feita a do camarão e veja a época que precisa ser feito, para garantir a eles o sustento nesse período".

Aparecida acredita que há uma falha na cadeia produtiva tanto do sururu quanto o de camarão com relação às mulheres - quem mais despinica o marisco. Para ela, no atual momento, a mulher se encontra muito fora da cadeia e não tem os mesmos benefícios dos demais.

 

Descascar o sururu é um dos processos da cadeia produtiva

FOTO: STELLA SANTANA
"Se eu trabalho diretamente na cadeia produtiva, é o único meio de sobrevivência, principalmente às mulheres, por que não ser beneficiada com esse tipo de seguro? Muitas mulheres, mesmo trabalhando na cadeia produtiva do camarão tiveram o seguro cortado. O seguro-defeso precisa de uma nova lei, precisa ser revisto, precisa ser feito novos estudos para que a gente possa incluir a mulher, que está fora da pesca, porém, na cadeia produtiva", destaca Maria Aparecida.

 

De acordo com o INSS, cerca de 9 mil pescadores recebem o seguro-defeso em Alagoas e reafirma que nenhum marisqueiro recebe o auxílio. 

O órgão disse que não se posiciona quanto a possibilidade de reformulação da lei do seguro-defeso, pois atende ao que está estabelecido por lei. Sobre o seguro já ter sido pago para a população, o INSS disse que desde 2015, quando órgão passou a realizar o pagamento do benefício, ele foi cortado já que a lei determina o pagamento apenas para espécie em extinção. O valor pago aos pescadores durante esse período não foi devolvido.

Segundo o diretor do Sindicato dos Corretores de Seguros de Alagoas (Sincor-AL), Djaildo Almeida, cabe ao governo federal fazer o atendimento aos pescadores, já que se trata de um seguro social. "É lamentável! Infelizmente resta ao poder público dar oportunidade para os marisqueiros em determinados períodos, seja com auxílio assistencial ou mais oportunidade de emprego".

POPULAÇÃO CONVIVE COM AS MAZELAS DO LIXO E ESGOTO

Viver em meio ao lixo, correndo riscos de adquirir todos os tipos de doenças. É assim que vivem os pescadores da comunidade Sururu de Capote. A sujeira que toma conta do lugar coloca os moradores numa linha de extrema pobreza. E não há muito o que fazer. O jeito para eles é aprender a viver daquela maneira. Não tem outro jeito. Não é difícil encontrar ali alguém que não tenha adquirido alguma doença, como resultado de todo o lixo espalhado pelo local. 

APRENDER A VIVER: É algo que só a dificuldade ensina

Todo tipo de material é encontrado dentro da lagoa, que serve de sustento para tanta gente pobre daquele lugar. É a única fonte de renda, mas também uma farta fonte de doença. O marisqueiro Jonathan Soares já sentiu na pele o que é ser vítima do lixo. Ele contraiu a bactéria da leptospirose em uma das enchentes que teve no local. 

Jonathan era adolescente quando começou a trabalhar e, como tantos outros ali, precisou ajudar no sustento da família. Ele conta que passou três meses em coma e teve seu estado agravado para o quarto grau da doença, desenvolvendo a Síndrome de Weil.

"Eu tive três hemorragias, duas renais e uma pulmonar interna, três paradas cardíacas, cheguei a perder muita massa muscular por ter ficado três meses sem me alimentar".

 

Lixo à margem da lagoa é uma das razões do 'sumiço' dos pescados e das doenças que atingem os moradores da região

FOTO: PATRÍCIA MENDONÇA

O lixo está associado a vários tipos de enfermidades. É um dos principais problemas para uma sociedade que cada dia mais consome e menos tem educação. O resultado são dejetos acumulados inadequadamente. Além disso, a sujeira a céu aberto atrai animais que transmitem doenças aos seres humanos.

Jonathan é o exemplo vivo do mal que o lixo pode fazer para a sociedade.

*Edição: Thiago Gomes




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