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Opinião
27/08/2018 16:30:00

Kátia Abreu: 'Brasil não precisa de valentão que saca pistola, precisa de ideias'


Kátia Abreu: 'Brasil não precisa de valentão que saca pistola, precisa de ideias'
Ilustração

Vice de Ciro Gomes (PDT) na disputa pela Presidência da República, Kátia Abreu (PDT) tem a missão de aproximar o candidato de ruralistas e empresários. Pecuarista, ex-presidente da CNA (Confederação Nacional da Agricultura) e ex-ministra da Agricultura, a senadora pelo Tocantins organizou, na sexta-feira (24), um encontro entre Ciro e representantes do agronegócio na capital Palmas.

Anunciada como vice depois que naufragou a desejada aliança de Ciro com o PSB, Kátia Abreu afirma que apoiaria o correligionário "em qualquer hipótese". Como vice e mais identificada com o centro do espectro político, pode buscar os votos de setores resistentes ao candidato e que demonstram mais simpatia a Jair Bolsonaro (PSL), líder nos cenários sem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em entrevista ao HuffPost Brasil, a senadora diz que o Brasil precisa de alguém com "autoridade e firmeza" e que Ciro tem esse perfil. "Eu me julgo parecida com o Ciro. Nós somos brigões."

A senadora também diz ser a favor da regularização de terras indígenas e quilombolas, como defende o programa de governo de Ciro, e parece alinhada com o companheiro de chapa no que diz respeito ao projeto que flexibiliza o uso de agrotóxicos, já aprovado em comissão da Câmara.

Conhecido como PL do Veneno, o projeto concentra o registro de novos agrotóxicos no Ministério da Agricultura, reduzindo o poder de outros órgãos. Para Kátia Abreu, a medida desperta desconfiança no consumidor e "não vale a pena"; em sintonia com a senadora, Ciro defendeu, na agenda no Tocantins, que seja mantido o papel da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no controle dos agrotóxicos.

Ciro Gomes e Kátia Abreu, ambos do PDT: semelhanças e diferenças.
 
Ciro Gomes e Kátia Abreu, ambos do PDT: semelhanças e diferenças.

Nem tudo, porém, é semelhança. E, para Kátia Abreu, tudo bem.

"Sou candidata a vice do Ciro, mas isso não significa que eu tenha que ser um clone dele", afirma. O candidato, por exemplo, já se posicionou contra a interferência do Estado na questão do aborto; a vice, por sua vez, é a favor da manutenção da lei atual, que autoriza a interrupção da gravidez em apenas 3 casos (estupro, risco de morte e feto anencéfalo).

Embora diga que "o Brasil não precisa de valentão que saca pistola", Kátia Abreu apoia a flexibilização do Estatuto do Desarmamento, especialmente para quem vive no campo; Ciro, por sua vez, diz que não facilitará o porte de arma"para ninguém" se for eleito. Segundo pesquisa Datafolha divulgada nesta semana, 58% dos brasileiros dizem que a posse de armas deve continuar proibida.

Nesta entrevista, a senadora também fala sobre os memes que postou em sua conta no Twitter depois que a foto oficial da chapa Ciro-Kátia viralizou, por excesso de Photoshop. "Eu ri demais, achei o máximo. Não achei que fosse fazer tanto barulho", diverte-se.

HuffPost Brasil: Por que a senhora aceitou ser vice do Ciro Gomes e o que pode agregar à campanha?

Kátia Abreu: Eu já era Ciro, já estava em campanha por ele. E digo com muita franqueza: não estou mais em idade mais de apoiar qualquer um só porque o partido mandou. Graças a Deus ele está no meu partido, mas eu queria apoiá-lo em qualquer hipótese e estava ajudando em tudo o que eu podia com relação às alianças. Eu acredito no projeto e vou ajudar no que for preciso para realizar esse projeto.

Qual é o projeto?

Eu gosto das ideias com as quais ele está se comprometendo. Eu acho que o Brasil não precisa de um valentão que saca pistola, precisa de ideias. O Brasil precisa de alguém com autoridade e firmeza — e não digo autoritário. Precisa de alguém com autoridade moral e atitude. Eu acho que o Ciro tem esse perfil. Ele é muito franco.

Mas qual é o projeto para o País com o qual a senhora se identifica?

Nós temos um rombo fiscal que impede o País de crescer, e o que as pessoas veem é o desemprego. Uma coisa está ligada à outra, e eu não tenho como falar em emprego se eu não estiver muito consciente da importância do ajuste fiscal para gerar emprego. É isso que as pessoas querem, elas querem trabalhar.

Eu gosto de falar em emprego e trabalho. Emprego é aquele que contrata, mas tem muita gente que quer trabalhar de forma autônoma e não consegue, que quer fazer sua empresa crescer e não consegue. Então eu acredito que trabalho e emprego sejam os maiores desafios do País hoje.

Mas como consertar isso sem fazer o milagre de equilibrar as contas públicas? Eu acho que o Ciro está preparadíssimo e consciente do que precisa ser feito.

A senhora está alinhada com a opinião do Ciro a respeito da reforma trabalhista?

Eu votei contra a reforma trabalhista, não por conta dela toda, mas pelos mesmos motivos que o Ciro tem [para ser contra o texto]. São 8 pontos que o Michel Temer prometeu que iria mudar para garantir o voto da base dele no Senado. São 8 mudanças cruciais.

A senhora comentou sobre o perfil do Ciro, disse que ele tem autoridade. Já teve algum problema por conta do temperamento forte dele?

Se eu não tive problema nem com a Dilma [Rousseff], por que teria com o Ciro? Todo mundo dizia que a Dilma era difícil, eu nunca vi Dilma difícil. E todo mundo só dizia isso. Comigo ela era uma pessoa muito educada, equilibrada e respeitosa.

Eu me julgo parecida com o Ciro — eu sou mais nova, tenho 56 e ele tem 60, então eu tenho que dizer que eu que pareço com ele. Sabe em que a gente se parece muito? Nós somos brigões. Não somos briguentos, há uma diferença grande. Briguenta é a pessoa que cria caso com tudo, chata, que gosta de brigar. Nós gostamos da luta, temos ideais.

A senhora é uma importante representante dos ruralistas, sempre foi vista como inimiga dos ambientalistas e já foi chamada de "miss desmatamento". O plano de governo do Ciro cita a regularização fundiária de terras indígenas e quilombolas como uma das prioridades para o meio ambiente. Isso pode, de alguma forma, causar conflito com a senhora?

Não, porque eu também sou a favor. Existem muitas áreas que já foram demarcadas, mas só na ilusão, porque não foram efetivadas. É esse tipo de morosidade e burocracia que cria os conflitos no campo.

Eu sou totalmente contra invasão de terras, de prédios, de casas. Eu acho que preservar a propriedade privada é sinal de civilização equilibrada. Invadir terra é muito bárbaro, muito medieval. Nós temos um Estado de direito, uma Constituição. Mas regularizar eu sou a favor.

Preservar a propriedade privada é sinal de civilização equilibrada. Invadir terra é muito bárbaro, muito medieval.

A maioria das áreas de reserva ambiental nacionais e grande parte das estaduais só existem no papel. Não tem nada efetivado, regularizado e pago, indenizado.

Regularizar a questão fundiária é coisa de gente civilizada, seja lote de território urbano ou rural, indígena, quilombola ou assentado da reforma agrária. Se está demarcado, se está feito, documentar é importante para evitar litígios.

 

WENDERSON ARAUJO/AFP/GETTY IMAGES
Kátia Abreu em foto de 2015, quando era ministra da Agricultura do governo Dilma Rousseff.

 

Qual a sua opinião sobre o PL 6299, que flexibiliza o uso de agrotóxicos e ficou conhecido como PL do Veneno? Votaria a favor?

Eu não vi o PL. Ele é tão famoso, mas eu não vi porque a gente não antecipa discussão, espera chegar ao Senado.

Com toda a sinceridade, só tem um item que eu sei que está lá e com o qual eu tenho reticências: passar toda a aprovação para dentro do Ministério da Agricultura. Na minha época de ministra, muitos me sugeriram isso, mas eu, como ministra e como representante do setor, não achava que seria justo com o nosso setor, porque todos ficariam desconfiados de nós, desconfiados da qualidade do produto. Não vale a pena.

Se continuar na Anvisa, eu quero que funcione. E que a burocracia burra não atrapalhe a autorização de novas moléculas, mais modernas, que podem fazer muito menos mal à saúde humana e ao meio ambiente.

Eu sou muito a favor do investimento em pesquisa em defensivos biológicos. Já temos alguma coisa no Brasil, mas precisamos pesquisar mais. Porque não dá para fazer agricultura tropical sem defensivo, sem agroquímico.

A senhora já manifestou posição contrária à do Ciro em algumas questões, como aborto e porte de arma. Vocês estão tentando se alinhar?

Eu sou candidata a vice-presidente do Ciro, mas isso não significa que eu tenha que ser um clone dele. Eu continuo com os meus princípios e com as minhas ideias e, principalmente no que diz respeito ao aborto, entendo que é uma questão pessoal e íntima, de foro íntimo.

Eu não vou discutir aborto com o Ciro Gomes, nem com ninguém. Não dou liberdade para ninguém querer que eu mude a minha posição. Eu ouço as pessoas, dialogo, mas tenho uma opinião formada sobre isso. Não vou atirar pedra em ninguém e sou solidária às pessoas que sofrem em qualquer circunstância. Mas não gostaria de mudar a legislação, acho que a legislação atual é adequada. E também não estou ouvindo o Ciro falar em mudar a legislação; isso é coisa do Congresso Nacional.

E quanto ao porte de arma?

Eu não sou a favor de armar a população. Eu só acho que a pessoa tem o direito de querer se sentir segura, principalmente no campo. Mas não quero guerra no campo, nem na cidade.

Criamos o Ministério da Segurança Pública, mas o que mudou na nossa vida?

Tem gente que consegue o porte de arma e não sai com a arma na rua. A pessoa quer se proteger em casa mesmo. Mora em casa, em fazenda, em chácara. As pessoas estão se sentindo desprotegidas, porque o pessoal está armado até os dentes. Enquanto eles estão vindo de .50, a nossa polícia está com .40.

Mas eu sinceramente espero que as pessoas não precisem disso. O povo brasileiro é pacífico, não é violento. Eu não tinha a menor preocupação com isso, mas me preocupa o aumento da violência. E eu não vejo o governo fazer nada. Criamos o Ministério da Segurança Pública, mas o que mudou na nossa vida? Eu até gosto do ministro [Raul] Jungmann, acho que ele é uma pessoa correta e preparada, mas o que mudou na nossa vida?

Então, vamos comprar .50 para os policiais, vamos comprar equipamentos modernos e de inteligência. Por que nós não fazemos isso?

A senhora já fez discursos bem duros contra o presidencialismo de coalizão e a oferta de cargos em troca de apoio, mas o Ciro buscou uma aliança com o centrão...

Não, o centrão que buscou o apoio do Ciro para poder se valorizar depois. O Ciro não procurou o centrão, eles que procuraram o Ciro. E também não haveria problema em tentar alianças para ter tempo de televisão. Eu só acho que o centrão nunca pensou em fechar com o Ciro de verdade, mas, como o PSDB é um partido higienista, com mania de limpeza moral, estava deixando o centrão de lado, e o centrão quis se valorizar.

Mas minha pergunta é: se vocês forem eleitos, como irão governar?

Nós acreditamos em uma boa renovação do Congresso Nacional, acho que a população vai melhorar a qualidade do voto. Está todo mundo triste com a política, mas tem muita gente boa no Congresso, eu acredito nisso verdadeiramente. Também acredito que quem impõe o ritmo do jogo é o capitão. E quem não quer uma boa equipe, que acate o projeto que ganhou nas urnas? O Ciro está sendo muito franco e aberto nas suas propostas, está até se arriscando a perder votos.

Em que proposta ele está se arriscando a perder votos?

No dia em que ele criticou a reforma trabalhista, por exemplo, teve muita gente que não gostou. Podia ter ficado caladinho, não era mais fácil? Mas ele foi corajoso e honesto.

A senhora mostrou bom humor no episódio da foto da campanha e admitiu que teve uso de Photoshop...

E quem não usa? (risos) Mas na minha foto exageraram. Ficou feio demais.

Naquele dia vocês entraram na brincadeira e fizeram vários posts no Twitter, que acabaram viralizando. O que foi ideia sua e o que foi ideia da equipe?

Olha, eu tenho pouca liberdade com o pessoal do Ciro em São Paulo e estava no Tocantins. Mas eu senti aquilo mesmo, achei ridícula aquela foto. Eles é que deveriam ter visto isso, e eu nem precisei falar nada, porque o Twitter falou por mim.

O meu Twitter é o único instrumento de rede que eu faço sozinha, eu mesma tuíto. Aí eu fiz essa vingancinha com a equipe de comunicação de São Paulo. Eu ri demais, achei o máximo. Não achei que fosse fazer tanto barulho. Me deu força lá na comunicação, entendeu?

 



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