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Eleição 2018
12/08/2018 14:30:00

Cabo Daciolo, um histriônico efeito colateral da legislação eleitoral


Cabo Daciolo, um histriônico efeito colateral da legislação eleitoral
Ilustração

O Partido Novo reuniu 236.000 assinaturas para pressionar a Band a incluir seu candidato à presidência da República no debate de quinta-feira. A pressão de nada adiantou, porque João Amoêdo precisava ter alcançado outro número, muito menor, mas bem mais difícil de conseguir: cinco deputados federais. O Patriota atingiu o número mínimo para participar dos debates de tevê em abril, com a adesão de Pastor Eurico, o segundo deputado mais votado em Pernambuco em 2014. Cinco dias antes, Cabo Daciolo tinha se unido ao partido pelo qual hoje se apresenta como candidato à presidência da República — e do qual esteve longe de ser a primeira escolha. Ao empurrar uma candidatura nanica, o deputado tem uma missão bem maior do que se tornar a estrela histriônica dos debates, como aconteceu na embate entre candidatos: ele têm de ajudar o Patriota a não desaparecer.

“Se o povo compreender o projeto do Cabo Daciolo e perceber sua honestidade, ele pode ser bem sucedido. Se for muito bem sucedido, vai dar muitos votos de legenda. De repente, ele pode até ganhar a eleição! Aí a gente estourava a boca do balão”, torce Adilson Barroso, fundador e presidente do Patriota, explicitando que a candidatura é parte da luta pela sobrevivência partidária deflagrada pelas novas regras eleitorais, criadas com a intenção de reduzir a quantidade de legendas no país.

“Sem habilidade, se a gente não se cuidar, não passa nem a cláusula de barreira e acaba com o partido", diz Barroso, um ex-cortador de cana que tem 8,3 milhões de seguidores no Facebook. A barreira a ser ultrapassada por Daciolo e seu Patriota não é trivial: quem não eleger ao menos 9 deputados em 9 unidades diferentes da federação ou tiver menos de 1,5% do total de votos na Câmara com pelo menos 1% dos votos em cada unidade da federação estará fora. Daí a insistência do partido em ter um candidato ao Planalto para ajudar na estratégia.

Criado como Partido Ecológico Nacional (PEN) em 2013, o Patriota mudou de nome formalmente neste ano na expectativa da adesão do deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ). Sem conseguir entendimento com o capitão reformado, a legenda ainda cogitou lançar o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa antes de optar por Daciolo. “Ele é militar do Corpo de Bombeiros, enquanto o outro, que era possível pré-candidato nosso, é do Exército. Eu prefiro militar do Corpo de Bombeiros, que é a instituição de que o povo mais gosta no país”, justifica Adilson Barroso.

O presidente do Patriota, que é um dos 241 candidatos a deputado federal pelo partido em São Paulo, descreve o projeto de Daciolo como uma mistura entre investimento no consumo e na produção, além da redução de impostos. "O pessoal fala: 'quando se investe no consumo, gera inflação'. Na verdade, inflação se gera se você não investe no consumo", diz Barroso. No último sábado, quando o partido homologou a candidatura de Daciolo, Barroso citou o ex-presidente Juscelino Kubitschek para prometer "50 anos em quatro" e garantir que o partido tem projeto. "Cabo Daciolo, quando você entrar presidente da República, tira 10% dos impostos da gasolina. A inflação vai lá embaixo", discursou.

Linha de corte para o debate

Para participar do debate da Band, Daciolo se beneficiou de uma nova linha de corte para participar dos embates na TV. Se a atual norma exclui Amoêdo, ela era ainda maior até a minirreforma política de 2017, que reduziu de nove para cinco a quantidade de deputados necessários para justificar a presença na televisão. A medida que tenta inibir a participação de candidatos menos expressivos expôs logo no primeiro debate seus efeitos colaterais: além da candidatura do Novo, que, apesar de pequena, tem conseguido mobilizar uma militância razoável, a medida poderia ter deixado a segunda colocada nas pesquisas de fora do debate da Band. Marina Silva só foi incluída por conta de seus expressivos índices de intenção de voto, já que a Rede tem apenas dois deputados e um senador.

Garantido seu direito de estar em cena, Daciolo chamou a atenção do país ao atacar a classe política de forma ainda mais agressiva que Bolsonaro e sair distribuindo acusações a adversários e louvores a Deus. "O grande problema que a nação está enfrentando hoje é a falta de amor", decretou, em meio a críticas à ausência de voto impresso e à negação de que existe crise fiscal no país. A insinuação de que o ex-governador Ciro Gomes (PDT) faria parte da "Ursal" (União das Repúblicas Socialistas da América Latina) viralizou nas redes sociais. Foi o ápice de notoriedade de um ex-bombeiro que chamou a atenção do noticiário pela primeira vez em 2011, quando liderou uma greve de sua categoria no Rio de Janeiro. Por comandar a ocupação do Quartel Central, ele acabou preso disciplinarmente e expulso da corporação com outros 13 colegas — todos foram anistiados posteriormente.

A bravura do cabo chamou a atenção do PSOL, que ofereceu a legenda para a candidatura de Daciolo à Câmara em 2014. Ele foi eleito com 48.831 votos graças à defesa da PEC 300, uma proposta de emenda à Constituição que pretendia vincular os salários dos bombeiros e policiais militares do país ao rendimento da Polícia Militar do Distrito Federal, o mais alto do país. Mas a relação entre o deputado e o PSOL foi breve. Já em sua diplomação, ele tietou Jair e Flávio Bolsonaro, com quem tirou uma foto, causando desconforto no partido. Os constantes louvores a Deus na tribuna da Câmara incomodaram os psolistas, que decidiram pela expulsão já em 2015 após o deputado apresentar uma PEC com o objetivo de alterar na Constituição a expressão "todo o poder emana do povo" para "todo o poder emana de Deus" — o estatuto do PSOL não permite protocolar projetos de cunho religioso.

Daciolo ainda se envolveu em outra polêmica com o partido antes da expulsão ao defender os policiais que estariam envolvidos na morte do pedreiro Amarildo de Souza em 2013. Mais recentemente, Daciolo anunciou da tribuna da Câmara a cura da deputada Mara Gabrilli (PSDB), tetraplégica desde 1994. "O que eu vou falar aqui vai parecer loucura para muitos. Mas eu prefiro a loucura de Deus do que a sabedoria dos homens", anunciou, destacando que não estava ali para "pregar religião". Na ocasião, ele contou que a deputada o parou num dos corredores do Congresso Nacional e ele finalmente teve coragem de dizer algo que Deus havia lhe pedido dois anos atrás. Após ler um trecho da Bíblia, como fez no debate da Band, Daciolo profere: "Eu quero aqui, diante de todos, profetizar a cura da deputada Mara. Eu quero que aquela mulher vai levantar da cadeira e vai começar andar". “Eu saio daqui e vou me direcionar a ela. Vou a um lugar em particular. Creio que em alguns minutos ela voltará a andar", finalizou.



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