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Saúde
15/06/2018 12:09:00

Uma nova forma de ver e conviver com o paciente com demência


Uma nova forma de ver e conviver com o paciente com demência
Ilustração

Na semana passada, acompanhei o XXI Congresso Brasileiro de Geriatria e Gerontologia durante dois dias. Tive inclusive a oportunidade de participar de uma roda de conversa sobre o papel do jornalismo na divulgação científica, ao lado de Claudia Jurberg e Eloisa Adler. Nas próximas semanas, pretendo compartilhar os conteúdos das palestras a que assisti, e aproveito para começar a série com a emocionante apresentação de Kate Irving, enfermeira e professora da Dublin City University. Para Kate, o aspecto mais cruel da demência é que todos deixam de enxergar a pessoa, não vendo nada além da doença, num processo de desumanização do indivíduo. “Temos que tentar nos conectar, reconhecer o outro. Do contrário, a relação com o paciente será baseada em tarefas, como se ele não tivesse um passado, uma vocação e habilidades, valores e crenças”, enfatiza.

Demência: o aspecto mais cruel da doença é que todos deixam de enxergar a pessoa, não vendo nada além da enfermidade (Foto: https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=40153808)

Trabalhando há 20 anos nessa área, ela tem muitas histórias que ilustram o risco de nos tornarmos insensíveis. Segue a minha preferida: tarde fria numa instituição em Dublin e os casacos estão pendurados numa parede – todos parecidos, em tons de cinza ou azul-marinho. Um idoso se aproxima e, metodicamente, enfia a mão no bolso direito de cada agasalho. A enfermeira que está ao lado de Kate diz que isso faz parte do comportamento errático do doente, mas ela resolve observar e vê que ele procurava um determinado bolso direito que continha um papelzinho, porque aquele era o seu casaco! “Pôr o papel no bolso direito era o método que ele havia adotado para não pegar o casaco errado, ou seja, havia essa preocupação, seria um engano que o deixaria embaraçado. Às vezes temos que dar um passo para trás e observar sem intervir, porque a pessoa com demência faz um esforço enorme para lidar com aquela situação”, explica.

Para reforçar sua tese, ela afirma que a sigla BPSD (Behavioral and Psychological Symptons of Dementia, o equivalente a sintomas comportamentais e psicológicos da demência) também poderia ser lida como Basic Personal Signs of Distress, isto é, sinais de angústia e aflição, já que a perda progressiva de suas funções causa enorme sofrimento ao paciente.

Numa coluna do ano passado, mencionei o vídeo “Dementia from the inside” (“Demência vista de dentro”, em tradução livre), que está disponível no YouTube, produzido com base em depoimentos de doentes. Uma boa oportunidade de nos colocar no lugar deles.“Os exames e testes só focam nos problemas, e nunca nas forças daquela pessoa, no que ela pode fazer. Assim reduzimos o indivíduo a um paciente de demência ou Alzheimer, interpretando todos os seus atos como patologia.

Em vez de falarmos: ‘não estou entendendo o que você diz’, a frase que acaba saindo é ‘você está confuso’, e assim por diante. Com frequência o comportamento que parece sem sentido na verdade indica o que está acontecendo no seu mundo, por isso é importante ouvir o que ele tem a nos dizer”, pontuou Kate, reconhecendo que o currículo dos profissionais de saúde ainda está longe dessa abordagem. No entanto, esse olhar pode começar dentro de casa com nossos entes mais próximos, não? Matéria g1



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