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- ‘O jornalista alemão Thomas Milz mora no
Brasil há 20 anos e conta que nunca sentiu o clima político tão tóxico. Para
ele, sendo candidato ou não, Lula será a peça mais importante deste ano
eleitoral’.
Lula. Mesmo neste início de 2018, precisamos
inevitavelmente falar sobre o ex-presidente. É que, daqui a exatamente um ano,
ele poderá voltar a ocupar o cargo executivo mais alto do país.
Mas, primeiro, o Tribunal Regional Federal da 4ª
Região em Porto Alegre deverá julgar o recurso no caso do tríplex do Guarujá.
Vai ser no dia 24 de janeiro – um verdadeiro toque de trombetas para abrir o
ano eleitoral.
Uma condenação acaba com as perspectivas de Lula
sobre uma candidatura? Nem mesmo especialistas em Direito parecem ter uma
resposta clara a essa pergunta. É possível que haja mais recursos e apelações.
O STF ainda poderá se pronunciar sobre a Lei da Ficha Limpa e sobre a prisão
após condenação em segunda instância.
Tampouco uma absolvição serviria para esclarecer a
questão, já que Lula ainda deverá enfrentar outros processos este ano.
A única coisa que parece certa é que o Brasil se
encaminha para uma eleição presidencial realizada sob ressalvas jurídicas.
Em outras palavras: o caos político continua.
Isso é bom para nós, correspondentes estrangeiros
no país. Já a condenação de Lula em primeira instância, no ano passado, chamou
muita atenção na Alemanha. É inegável que o ex-presidente era e é uma figura
excepcional, não importa o posicionamento político ou pessoal que se tenha em
relação a ele. A biografia incomum, o carisma irresistível e os êxitos
surpreendentes no combate à pobreza o transformaram no queridinho da imprensa.
O fato de Lula subitamente se ver envolvido
em um escândalo de corrupção, o mensalão, foi explicado aos leitores
alemães com a observação de que a política lamentavelmente é um negócio
sujo. E que sem um pouco de corrupção não se faz nada. E assim Lula deixou
o palco político do país em 2010 com níveis recordes de crescimento e
popularidade e aclamado pela imprensa internacional.
Mas os tempos mudaram. Após quatro anos de Lava
Jato, caos político e a condenação em série de empresários e políticos de todos
os campos, ficou difícil explicar a situação do Brasil aos leitores alemães.
Os ânimos agitados por todos os lados contribuem
para isso. Para alguém de fora, parece um Fla-Flupolítico, com toda
a comoção, paixão e drama de novela que fazem parte de um clássico como esse.
Os torcedores gritam para que o juiz tire os jogadores do time adversário de
campo. Em seguida, quando ele apita contra o próprio time, o xingam de ladrão.
Nesse contexto, fica cada vez mais difícil avaliar
racionalmente se a bola bateu na mão ou a mão na bola, se o pênalti foi
corretamente apitado ou quem é o vencedor moral da partida. Juntam-se a isso
mensagens de ódio e difamação de todos contra todos nas redes sociais.
Nos últimos 20 anos, eu nunca percebi o clima
político e social brasileiro tão tóxico como agora. Um profundo amargor
substituiu a leveza dos brasileiros. Há alguns dias, um taxista em Salvador me
contou que não tem coragem de dizer aos seus passageiros que é petista – mesmo
que, com a ampliação maciça das universidades públicas e o aumento de escolas
técnicas, Lula tenha feito mais pela Bahia do que todos os outros políticos
juntos.
Enquanto isso, manifestantes na Zona Sul do Rio de
Janeiro exigem a prisão imediata de Lula. Eles dizem que não pode haver
misericórdia com o "chefe do petrolão".
Hoje, Lula é a figura que racha o Brasil entre
apoiadores e adversários. E, assim, é ele que vai definir a eleição de 2018 –
seja como candidato, seja como excluído da votação.
Em 2018, todos precisaremos falar sobre Lula.