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14/03/2011 14:58:14

Dia da Poesia: nossa homenagem a Jorge de Lima e a todos os poetas


Dia da Poesia: nossa homenagem a Jorge de Lima e a todos os poetas
Jorge de Lima poeta nascido em União dos Palmares

Com flogrão // lelo macena

 

Mais de meio século após sua morte, a obra do alagoano Jorge Mateos de Lima continua sendo um enigma para os seus poucos leitores, assim como para a crítica literária brasileira. Para muito além de Essa Nega Fulô e Acendedor de Lampiões, o poeta deixou uma vasta produção que até hoje impressiona e clama por uma leitura mais aprofundada, que ajude a desvendar a rica simbologia contida em seus versos.

Artista em constante mutação, homem de temperamento inquieto, poucos nas artes brasileiras foram tão abertos à aventura artística quanto Jorge de Lima: foi poeta, artista plástico, escultor e até se aventurou na música como pianista. É também considerado o artista pioneiro da fotomontagem na América Latina.

Generoso, qualidade que o diferenciava em meio à classe artística alagoana, Jorge de Lima colecionava amigos e admiradores pela forma respeitosa e carinhosa com a qual tratava a todos. Médico sanitarista e clínico geral dos mais conceituados, não cobrava dos pobres pelas suas consultas. Escritores e amigos também não pagavam. Na vida pública, aventurou-se em cargos políticos: foi deputado estadual em Alagoas pelo Partido Republicano Alagoano (1926) e vereador pela União Democrática Nacional no Rio de Janeiro (1946), onde chegou a assumir a presidência da câmara.

Considerado por muitos um dos maiores poetas brasileiros, o nome de Jorge de Lima vem à tona mais uma vez neste início de ano. O motivo é o relançamento de três discutidos livros do poeta que devem levar frisson à comunidade literária brasileira. Alguns estudiosos já se atrevem até a cantar a bola: seria esse o século da descoberta da obra poética de Jorge de Lima?

Poeta reeditado

Desde 2004 imbuída do propósito de publicar a obra completa do escritor, a editora Record, que detém os direitos autorais sobre o legado do autor, acaba de lançar Anunciação e Encontro de Mira-Celi, volume único que reúne três livros de poesia do alagoano: Tempo e Eternidade (1935), A Túnica Inconsútil (1938) e Anunciação e Encontro de Mira-Celi, escrito em 1943 mas lançado apenas em 1950, três anos após sua morte. Segundo a crítica, esses três títulos representam a fase religiosa e de fervor cristão do autor de Invenção de Orfeu.

Considerado um poeta em constante processo de evolução, Jorge de Lima já foi acusado pela crítica, mesmo que de maneira sutil, de seguir as correntes literárias que estavam na “moda”, para abandoná-las tão logo surgisse algo, digamos, mais interessante. Jorge iniciou-se na poesia sob a égide quadrada do parnasianismo. Foi assim também em XIV Alexandrinos (1941). Quando o modernismo dava seus primeiros passos no Brasil, ele aderiu ao regionalismo em Poemas (1927), Novos Poemas (1929) e Poemas Escolhidos (1932).

Em Invenção de Orfeu (1950), considerada sua obra-prima, Jorge de Lima ataca com um barroquismo impecável. Nos três livros lançados agora pela Record, os estudiosos o rotulam como “místico-universal”. É essa fase, justamente, uma das mais criticadas tanto pelos conhecedores de sua poesia quanto pelo seu público leitor.

Como assinala o poeta, crítico e Imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) Antonio Carlos Secchin, no texto introdutório de Anunciação e Encontro de Mira-Celi, a produção de Jorge de Lima, antes do lançamento de Tempo e Eternidade, livro inaugural de sua fase cristã, representa o que ele denomina de “a mais conseqüente adesão de um escritor nordestino ao espírito do modernismo”. Adesão a qual não foi vista com bons olhos por nomes como Graciliano Ramos e José Lins do Rego.

Para Secchin, o discurso contido no conjunto de três obras da Record, o qual ele denomina de “tríptico cristão”, foi visto na época como um “retrocesso” estilístico do poeta. Segundo ele, para a crítica, era como se a fé e o catolicismo expressos nos poemas de Jorge de Lima tornassem obscuro o “vigor” de sua poesia.

“A questão é extremamente complexa, e, certamente, bem poucos críticos veriam nos ‘livros cristãos’ o ápice da poesia de Jorge de Lima”, diz Antonio Carlos Secchin. Para ele, o caminho a ser seguido, no que diz respeito à leitura dos três livros, é o de se despir de preconceitos - tanto contrários, quanto a favor -, e buscar em seus poemas “cristãos” algo que possa indicar novas veredas que conduzam ao entendimento do complexo legado do poeta alagoano. “Para mim, o que impressiona em Jorge de Lima é o poder mágico da sua linguagem. Mais do que o lado lúdico, seus poemas deixam claros todo o poder e toda a autonomia da palavra”, observa Secchin.

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A poesia restaurada em Cristo

Escrito em parceria com o poeta e amigo Murilo Mendes (1901-1975), Tempo e Eternidade traz 44 poemas. Tristão de Ataíde recebeu o título das mãos de Murilo justamente na véspera de Pentecostes e se comoveu. O livro é aberto com o lema “Restauremos a poesia em Cristo”. A Santíssima Trindade é exaltada em toda a obra. São inúmeras as menções a “Deus”, “Senhor”, “Cristo”, “Pai” e “Jesus”. No poema que abre o livro, Distribuição de Poesia, os primeiros versos já avisam sobre o teor do restante da publicação: “Mel silvestre tirei das plantas, / sal tirei das águas, luz tirei do céu./ Escutai, meus irmãos: poesia tirei de tudo/ Para oferecer ao Senhor...”.

Sobre A Túnica Inconsútil, em nota preliminar da edição de Poesia Completa, da Editora Nova Fronteira, publicada no jornal O Estado de São Paulo em 8 de janeiro de 1939, o escritor Mário de Andrade deixa claro o espanto que a produção poética de Jorge de Lima causava, então. Ele escreve: “A significação de Jorge de Lima, a personalidade deste grande poeta brasileiro, talvez nunca tenha já estado tão misteriosa como depois da publicação de seu novo livro de poesia, A Túnica Inconsútil. (...) Eis um artista que não poderá ser perfeitamente compreendido, ou pelo menos ser explicado, sem uma exegese bastante pormenorizada”. No livro, a atmosfera religiosa também encontrada em Tempo e Eternidade é cultivada nos 72 poemas que o compõem.

“O inesperado ser começou a desenrolar as suas faixas em que estava escrita a história da criação passada e futura. Retirou a sua imensa cabeça de dentro da torre, sob o estrondo das muralhas desabadas com o seu gesto. A estreita porta abriu-se para ele passar...”. É dessa forma, enigmática e metafórica, que Jorge de Lima abre Anunciação e Encontro de Mira-Celi, no primeiro poema em prosa dos 59 que fazem parte da obra. É como se ele, de acordo com o estudo introdutório de Antonio Carlos Secchin, preparasse o leitor para “o caráter enigmático do que lhe espera”. E o leitor é advertido sobre isso: “Pouca gente encontrará a chave deste mistério”.

O lançamento dessas três obras pela Record traz à baila, de novo, a figura emblemática do poeta alagoano, e lança mais uma vez o desafio: quem se habilita a desvendar os mistérios contidos na rica obra de Jorge de Lima? A seguir, alguns caminhos possíveis a serem tomados para quem busca compreender o gênio único do “príncipe dos poetas alagoanos”. |LM





Em União dos Palmares, desleixo e esquecimento



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